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domingo, 20 de março de 2011

A minha segunda chance


Até hoje, quando olho para essa foto, não acredito como escapei com vida daquele acidente. Definitivamente, não era a minha a hora. Levei muito tempo para entender ao certo tudo que acontecia na minha vida naquele momento.

Mas, se eu tivesse que resumir, te diria que naquela madrugada do dia 25 de maio de 2001 eu ganhei de Deus uma segunda chance para recomeçar a escrever minha história aqui na Terra, para completar com êxito a minha missão.


Foram dias, meses, anos bem difíceis. Fazia pouco mais de cinco meses que eu perdera o meu pai. E apesar da aprovação no vestibular da UFRJ no início daquele ano, o trauma experimentado no ano anterior eram bem visíveis. Vivia um momento muito conturbado em casa, brigas diárias com a minha mãe, uma relação um pouco distanciada com o meu irmão. Era tudo muito triste e difícil. Estar em casa era um verdadeiro martírio. Você não se sentir bem na sua própria casa é muito complicado e desesperador. Injustamente, eu despejava toda minha revolta e raiva em cima da minha mãe e do meu irmão. A fortaleza do ano anterior se transformara em uma pessoa arredia, explosiva e que se julgava capaz de viver isolado, sem carinho e amor.
Naquela noite, houve uma festa de recepção dos calouros da UFRJ em uma boate na Barra da Tijuca, que hoje não existe mais. E você que já foi calouro um dia na vida, sabe que não se perde evento algum nessa época de faculdade, não é mesmo? Comigo não foi diferente. Fui de carro, levando comigo quatro colegas de turma da faculdade. Teria sido somente mais uma festa universitária. Mas, mesmo sob os riscos da tragédia que poderia ter acontecido, aquela noite acabou sendo um diferencial na minha vida.
Antes de você pensar besteira ao meu respeito, meu consumo dentro e fora da boate se resumiu a um refrigerante e metade de uma caipirinha que dividi na ocasião com a minha namorada da época. Não que em outras oportunidades do passado eu não tenha assumido riscos desnecessários ao volante, mas naquele dia eu estava tranquilo.
Vou resumir a história e poupar vocês de vários detalhes do acidente e os desdobramentos, pois o objetivo do texto é falar da segunda chance que recebi de Deus e não dar IBOPE ao acidente propriamente dito, ok?
Pois bem, voltemos ao texto. No caminho de volta para casa (deixando antes os meus colegas em suas respectivas residências), de madrugada, ao passar pelo cruzamento entre duas famosas ruas em Copacabana, meu carro foi acertado por uma Ranger, provocando o aludido acidente. Rapidamente, fomos socorridos pela unidade do Corpo de Bombeiro em Copacabana e encaminhados à emergência do Hospital Miguel Couto. Todos com vida, graças a Deus, embora com algumas lesões que exigiram bastante cuidado de todos nós.
Acordar na emergência de um hospital, desorientado, com dor e sem saber se os seus colegas estão vivos e se o seu quadro clínico inspira maiores cuidados médicos é desesperador. Mas, não há coisa pior que ouvir sua mãe desesperada chorando a poucos metros de você, tendo sido acordada no meio da madrugada com uma ligação informando que o filho dela sofrera um acidente de carro e que estava sendo levado para o hospital. Juro, não desejo isso a ninguém.
E foi justamente nesse momento que percebi a intervenção divina na minha vida. Do Miguel Couto, fui transferido para um hospital particular. Pelo pouco que lembro, havia uma certa preocupação dos médicos com a hemorragia cerebral e o traumatismo craniano que eu tinha, razão pela qual fui submetido a um exame, pouco antes de dar entrada no CTI.
Dentro daquela câmara ou algo do gênero, um filme da minha vida passou pela minha cabeça. Naqueles poucos minutos, consegui refletir sobre tudo que estava acontecendo comigo. Lembro bem de ter chorado bastante durante o exame. Não lágrimas de dor pela dor na cabeça, pelo ferimento da perna, pelos ligamentos rompidos do ombro esquerdo ou pela fratura na coluna cervical. Era por todo o sofrimento que o meu comportamento estava causando a quem eu tanto amava: minha família. Ali percebi que estava fazendo absolutamente tudo errado. Estava falhando como filho, como irmão, como amigo, como ser humano. E o pior: descumprindo uma das promessas que fizera ao meu coroa pouco antes dele falecer.
Lembro como se fosse hoje. Naqueles minutos realizando o exame, a única coisa que eu pedia a Deus era escapar com vida, com saúde para não dar trabalho a ninguém da minha família. E que se ele me desse uma segunda chance, eu faria tudo diferente dali em diante. Nos minutos que se sucederam aquele pedido, eu rezava. E rezar ali significou muito a mim, pois desde que soubera que meu pai estava acometido de metástase, eu me afastara de Deus. Minha fé sucumbiu na primeira dificuldade. Mas, eu perdi perdão ao cara lá de cima. E rezar durante boa parte do exame me deu uma paz, uma tranquilidade, uma certeza de que eu seria merecedor de uma segunda chance.
Pouco depois, ouvi de algum médico que o resultado havia sido positivo, que não havia maiores razões para preocupação. Fora só um susto. E que susto. Eu escaparia daquele acidente sem maiores problemas (embora até hoje sinta dores na coluna e desconforto no ombro esquerdo, mas porra, estou vivo).
Daquele dia em diante eu começava uma nova vida. Completamente diferente daquela que estava vivendo até ali. Claro que eu voltei a pisar na bola algumas vezes com o povo daqui de casa, óbvio que eu errei em outras oportunidades com o mundo. Sou humano, porra. Mas, aquele acidente foi importante para mim. Me aproximou de Deus e da minha família. Novamente me sentia amado. Ganhei um voto de confiança da autoridade superior. Veja, três dias depois eu saí do CTI e do quarto do hospital, vi o Pet fazer aquele gol de falta e o Flamengo conquistar o tricampeonato estadual sobre o Vasco da Gama, vulgo Colina do Mal. Sinal de que as coisas estavam mudando mesmo, e para melhor. De vez em quando eu sonho com o meu anjo da guarda brigando comigo, desesperado querendo se aposentar. Coitado, eu já dei muito trabalho ao safado. Tomara que nos assuntos celestiais haja adicional de periculosidade nesse tipo de atividade. Advogados ...
E mais, pensando aqui comigo, reparem, nessa minha segunda vida, quantas pessoas especiais eu conheci? Quantos momentos inesquecíveis conquistei? Quantos sentimentos experimentei? Quantos lugares conheci? Quantos novos capítulos da minha vida eu escrevi? E muito de tudo isso eu devo àquele acidente, porque na verdade, eu vejo que ele representou uma dádiva na minha vida, embora isso possa parecer macabro a vocês. Não tenho vergonha de dizer que todos os anos na data de aniversário do acidente, eu celebro. Celebro a vida, os bons momentos, a segunda chance que ganhei.
Toda vez que por algum motivo eu fico chateado ou desiludido com a vida, eu faço questão de lembrar daqueles momentos. A dor se converteu em esperança. O sofrimento em alegria. As vezes, infelizmente, precisamos perder algo ou alguém para darmos valor. Senti isso na pele. Literalmente.
Portanto, hoje quando você for se deitar, reflita um pouco sobre a sua vida. Sobre as suas atitudes, sobre as oportunidades. Não pense que você está só. Não se julgue acima do bem e do mal. Todos nós, absolutamente todos, precisamos de carinho, de gente para amar e nos amar. É o sentido da vida, ter com quem compartilhar seus sentimentos, suas conquistas, suas alegrias e tristezas. Nunca é tarde para começar de novo ou reconhecer um erro. Lembre-se que o amanhã pode nunca chegar, que um idiota pode avançar um sinal de trânsito em alta velocidade e abreviar sua história aqui na Terra. A felicidade começa e deve ser construída a partir de agora e não amanhã. Chega de relegar ao futuro o que precisamos para sermos felizes no presente. Não são todos que recebem uma segunda chance. Eu tive a minha vida e estou fazendo por onde. Uso como combustível para os meus sonhos. E você?
O mundo quer saber ...

2 comentários:

  1. Meu querido,
    Estive antes e depois do acontecido contigo.
    Sem dúvida, naquele quarto do hospital recebi a melhor zoação por uma derrota do Vasco.
    Isso porque, mesmo com pouco tempo de amizade, vê-lo bem depois de tudo foi um alívio.
    E o Rei continua nesse caminho sinuoso e cheio de pedras, com as quais o seu castelo, de familia unida e amigos que torcem pelo seu sucesso, vai sendo construido e seguindo em frente....

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  2. É rapaz... me lembro bem dessa época, afinal, são 22 anos de amizade...

    Como sou mais novo, ainda estava no 1º ano, e saí da saudosa Olimpalas para te visitar em casa... vc se lembra do que eu levei pra vc passar o tempo? hahahaha

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